Sr. Editor,
Paciente mulher, 42 anos, com história de cirurgia de Hartmann há 7 meses para tratamento de carcinoma colorretal, em avaliação pré-operatória para fechamento da colostomia. Negou queixas clínicas, comorbidades e quimiorradioterapia prévia. Durante realização de clister opaco (Figura 1), observou-se opacificação do ureter e sistema coletor renal esquerdo pelo meio de contraste baritado, compatível com fístula ureterocolônica, com trajeto fistuloso de difícil caracterização, provavelmente interligando o coto distal ao terço médio do ureter esquerdo.
Figura 1. Enema opaco de enchimento.
A,B: Incidências em perfil mostrando opacificação inicial do reto e cólon distal remanescente, ureter e sistema coletor renal esquerdo (
A) e opacificação posterior da bexiga urinária (
B).
C: Incidência em em posteroanterior demonstrando opacificação posterior da bexiga urinária.
Houve também opacificação com o meio de contraste, posteriormente, da bexiga urinária. A análise cuidadosa das imagens é importante para evitar um diagnóstico incorreto de fístula vesicoentérica com refluxo vesicoureteral associado.
Fístulas ureterocolônicas são raras, apresentando causas variadas, a maioria correspondendo a alterações de origem urológica
(1), de etiologia iatrogênica, inflamatória, neoplásica ou, ainda, idiopática. O recente aumento do número de ureteroscopias e laparoscopias contribuiu sobremaneira para o aumento de sua incidência
(2), pois a manipulação cirúrgica gera subsequente inflamação que acomete o ureter e leva à formação de fístula
(3). Anatomicamente, a maioria dos casos envolve o ureter direito em seus terços superior e médio, raramente ocorrendo à esquerda
(1,4,5).
O sintoma mais comum é dor abdominal inespecífica, usualmente de localização em flancos. Irritação peritonial com acometimento do músculo psoas pode acarretar na ocorrência da tríade de Morton, composta por dor lombar, adução da coxa e flexão do membro inferior. Ausência de sintomas digestivos é a regra, sendo ocasional a presença de pneumatúria ou fezes na urina
(6).
O diagnóstico pode ser feito durante a realização de exame radiográfico contrastado, como um clister opaco e uretrocistografia miccional retrógrada
(7). O clister opaco é o método mais confiável para demonstrar o trajeto fistuloso
(8). A uretrocistografia miccional retrógrada pode permitir a visualização do trajeto fistuloso, porém, pode apresentar dificuldade na identificação do meato ureteral devido a presença de edema circunjacente associado ao processo inflamatório e existência de obstrução do trajeto ureteral que se associa ao processo fistuloso. A tomografia computadorizada é o método mais sensível para identificação de gás na via urinária e observação do trajeto fistuloso.
O tratamento consiste na retirada cirúrgica da fístula, que apresentará técnica variável na dependência da porção ureteral acometida e também da presença ou não de uma eventual disfunção renal associada.
No caso aqui relatado, o surgimento da fístula foi iatrogênico por manipulação cirúrgica prévia. A realização do exame contrastado foi essencial para a paciente, pois permitiu que a fístula fosse corrigida já no procedimento cirúrgico que estava em planejamento, além de permitir o encaminhamento da paciente para a nefrologia para acompanhamento clínico de eventual disfunção renal em instalação.
REFERÊNCIAS
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5. Infantino A, Dodi G, Lise M. Ureteroduodenal fistula. Br J Surg. 1987; 74:499.
6. Ducassou J, Richaud C, Duvainage JF, et al. A rare etiology of ureterocolic fistula. J Urol Nephrol (Paris). 1977;83:252–4.
7. Conde Santos G, Griñó Garreta J, Bielsa Gali O, et al. Uretero-colonic fistula in non-functioning ureter. Arch Esp Urol. 2001;54:1126–9.
8. Cirocco WC, Priolo SR, Golub RW. Spontaneous ureterocolic fistula: a rare complication of diverticular disease. Am Surg. 1994;60:832–5.
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Vitória, ES, Brasil
https://orcid.org/0000-0001-8799-2951
Correspondência:
Dr. Michael Frank Pereira
Universidade Federal do Espírito Santo
Avenida Marechal Campos, 1355, Santa Cecília
Vitória, ES, Brasil
E-mail:
michaelfp@gmail.com
Recebido para publicação em 18/10/2017
Aceito, após revisão, em 27/12/2017