Carlos Antônio da Silva Franca1; Felipe José Cordeiro Queiroz Marques2; Antonio Carlos Pires Carvalho3; Antonio Belmiro Rodrigues Campbell Penna4; Sérgio Lannes Vieira5
RESUMO
OBJETIVO: Avaliar as terapias utilizadas em nossa instituição no tratamento dos sarcomas de extremidades de alto grau, mediante análise da sobrevida global do tratamento multidisciplinar. MATERIAIS E MÉTODOS: Estudo retrospectivo com 36 pacientes, no período de 1993 a 2007, em estádios IIb/III, submetidos a radioterapia externa após cirurgia com ou sem reforço de dose com braquiterapia. RESULTADOS: Trinta e seis pacientes foram submetidos a tratamento cirúrgico seguido de radioterapia externa, sendo que quatro pacientes (11%) receberam reforço de dose com braquiterapia e sete pacientes (19%) receberam quimioterapia. A dose mediana de radioterapia foi de 50 Gy (IC95%: 47–53 Gy), sendo realizado reforço de dose em quatro pacientes com braquiterapia, com dose variando de 16,2–35 Gy. A quimioterapia foi indicada em sete pacientes (19%) com margens positivas. Quinze pacientes apresentaram recidiva local e/ou a distância (42%) e todos faleceram. Vinte e um pacientes (58%) encontram-se sem evidência clínica e radiológica de recidiva local e/ou a distância. O seguimento mediano é de 88 meses (IC95%: 74–102). A taxa de sobrevida global para sete anos foi de 80%. CONCLUSÃO: Concluímos que a associação cirurgia + radioterapia apresenta-se como tratamento eficaz e com ótimas respostas e melhora da sobrevida global na possibilidade de associação da braquiterapia.
Palavras-chave: Sarcoma; Radioterapia; Braquiterapia; Quimioterapia; Tratamento conservador.
ABSTRACT
OBJECTIVE: To evaluate the therapies utilized in the authors’ institution for management of high-grade extremity sarcomas, analyzing the overall survival rates following multidisciplinary treatment. MATERIALS AND METHODS: Retrospective study developed in the period from 1993 to 2007 with 36 patients diagnosed with stages IIb/III, submitted to postoperative external beam radiotherapy, with or without boost dose, utilizing high-dose brachytherapy. RESULTS: Thirty-six patients underwent surgery followed by adjuvant external beam radiation therapy. Four patients (11%) received boost dose with brachytherapy, and seven (19%) received chemotherapy. The average dose for radiotherapy was 50 Gy (CI 95%: 47–53 Gy), and the four patients with brachytherapy boost received doses ranging from 16.2 to 35 Gy. Chemotherapy was indicated for seven patients (19%) with positive margins. Fifteen patients (42%) presented local or distant recurrence, and all of them progressed to death. Twenty-one patients (58%) remain with no clinical/radiological evidence of local/distant recurrence. The mean follow-up time was 88 months (IC 95%: 74–102). The overall seven-year survival rate was 80%. CONCLUSION: Combined surgery and radiotherapy is an effective treatment with excellent outcomes in cases where brachytherapy is associated, with improved overall survival rates.
Keywords: Sarcoma; Radiotherapy; Brachytherapy; Chemotherapy; Conservative treatment.
INTRODUÇÃO Sarcomas de partes moles são tumores raros, representando cerca de 1% das neoplasias malignas em adultos. Os homens são mais frequentemente afetados que as mulheres, e os negros mais que os brancos(1). No Brasil, dados de 1997 mostraram uma incidência de 2,8 casos por 100.000 habitantes(2). Os sarcomas são um grupo de tumores muito heterogêneo com características de alta malignidade e alto risco de recorrência local e a distância(3). O tratamento dos sarcomas ainda é um desafio, exigindo abordagem multidisciplinar, com intenção de alcançar a ressecção completa do tumor e a manutenção de uma boa função do órgão. Não obstante, falhas locais ao redor de 10–20% ainda assim ocorrem(2). Apesar do progresso conseguido nas últimas décadas, controvérsias sobre a melhor forma de tratamento permanecem, como o tipo de cirurgia (amputação ou conservação) e terapia neoadjuvante ou adjuvante, como a radioterapia (pré versus pós, tipo, dose, fração), e a quimioterapia(4). Radioterapia externa (RXTE) tem sido empregada na tentativa de se conseguir maior controle local dos sarcomas, entretanto, existe um aumento significativo de toxicidade tardia associada a altas doses de RXTE, que são necessárias para um controle local satisfatório, como fibrose tecidual, perda da função articular, neurites e edema do membro(5). A braquiterapia tem emergido como uma modalidade atrativa, pela possibilidade de redução das complicações locais sem redução da dose aplicada sobre o leito tumoral(6). O objetivo do presente estudo foi avaliar as terapias utilizadas em nossa instituição no tratamento dos sarcomas de extremidades de alto grau, mediante análise das taxas de sobrevida global do tratamento multidisciplinar. MATERIAIS E MÉTODOS Estudo retrospectivo de pacientes tratados no serviço de radioterapia, com diagnóstico de sarcomas, no período de 1993 a 2007. Foram avaliados 36 pacientes adultos, estadiados com base na classificação da Union for International Cancer Control/ American Joint Committee on Cancer (UICC/AJCC)(7), em: T2a – tumores com mais de 5 cm em sua maior dimensão, superficiais (localizados exclusivamente acima da fáscia superficial, sem invasão desta); T2b – tumores com mais de 5 cm em sua maior dimensão, profundos (localizados sob a fáscia superficial, com invasão ou penetração desta). Os sarcomas foram classificados em IIb (T2a N0 M0 alto grau) e III (T2b N0 M0 alto grau). Foram selecionados todos os pacientes com os seguintes critérios de inclusão:Em nosso serviço damos preferência ao tratamento com RXTE adjuvante, utilizando, sempre que possível, o reforço de dose com braquiterapia de alta taxa de dose, implantando os cateteres durante ato cirúrgico, a fim de reduzir a dose de irradiação externa e diminuir a possibilidade de fibrose tardia(8). Descrição das técnicas RXTE – A radioterapia deve ser compartimental e a demarcação correta dos campos de tratamento é de extrema importância, devendo ser sempre baseada nas imagens radiológicas, com descrição das margens e demarcação com clipes no ato cirúrgico, ultrapassando os campos 5 cm no sentido longitudinal e 2 cm nos limites laterais e profundos. São confeccionados moldes individuais para permitir o posicionamento correto e a reprodutibilidade do tratamento. Durante o planejamento técnico tentamos preservar sempre o máximo de tecido não comprometido e, em membros, evitamos irradiar toda a circunferência destes para diminuir a possibilidade de edema e fibrose. As doses utilizadas para RXTE podem variar de 40–60 Gy, com fracionamento diário de 1,8–2 Gy, mas nos casos de doses acima de 50 Gy com campos amplos e sem a possibilidade de braquiterapia como reforço de dose utilizamos reforço com RXTE na dose de 10 Gy com campos reduzidos, sendo os limites de 2 cm além dos clipes. Braquiterapia de alta taxa de dose – A braquiterapia permite irradiar restritamente o leito cirúrgico, com alta taxa de dose e com a tentativa de melhorar o controle local e reduzir complicações. A braquiterapia é realizada após a retirada da peça operatória e as margens do leito tumoral são demarcadas, com o campo cirúrgico aberto, colocando-se os cateteres com espaçamento de 2 cm entre eles e implantando- os o mais paralelamente possível ultrapassando 2 cm além dos clipes. O tratamento se inicia cinco dias após a cirurgia, de forma ambulatorial, com o paciente recebendo duas aplicações diárias com intervalo mínimo de seis horas. As doses podem variar entre 16,2–35 Gy, com frações de 2,7–3,5 Gy. Os esquemas utilizados foram:idade > 18 anos; ausência de metástase a distância; sarcomas de extremidades; sarcoma de alto grau histológico (grau histológico 3); radioterapia adjuvante.
Análise estatística Para análise dos dados foram calculadas as medidas de tendência central e de dispersão, sendo empregado o teste t-Student para variáveis contínuas e o teste do X2 para variáveis categóricas, tendo-se adotado nível de significância de 5% (p < 0,05) e intervalo de confiança de 95% (IC95%). A sobrevida atuarial livre de doença após sete anos foi analisada pelo método de Kaplan- Meier e pelo teste de log-rank. A análise estatística foi efetuada utilizando-se o programa estatístico SPSS for Windows versão 13 (SPSS Inc.; Chicago, IL, EUA). RESULTADOS Foram avaliados 36 pacientes que preencheram os critérios de inclusão do estudo. Os 36 pacientes foram submetidos a tratamento cirúrgico seguido de RXTE adjuvante, sendo que 4 pacientes (11%) receberam reforço de dose com braquiterapia de alta taxa de dose e 7 pacientes (19%) receberam quimioterapia, todos devido a margem cirúrgica positiva. Dois pacientes (5,5%) foram estadiados como IIb e os outros 34 (94,5%), como estádio III. Todos os 36 pacientes apresentavam tumores de alto grau histológico. A idade mediana foi de 53 anos (18–92/IC95%: 48–61), sendo 14 pacientes do sexo masculino (39%) e 22 do sexo feminino (61%). Margens cirúrgicas livres foram encontradas em 29 pacientes (81%) e margens positivas, em 7 pacientes (19%). A dose mediana de RXTE foi de 50 Gy (30–61 Gy/IC95%: 47–53 Gy), sendo realizado reforço de dose com braquiterapia em quatro pacientes, em razão da possibilidade de atuação do radioterapeuta no ato cirúrgico para implantação dos cateteres, com dose variando de 16,2–35 Gy e na forma dos esquemas descritos anteriormente. A quimioterapia foi indicada em sete pacientes (19%) com margens positivas, tendo sido realizada durante a radio terapia (cinco pacientes; 71%) ou após dois a quatro meses da radioterapia (dois pacientes; 29%). Os pacientes com margens positivas não receberam braquiterapia. Quinze pacientes apresentaram recidiva local e/ou a distância (42%), com tempo mediano para recidiva de 48 meses (36–84/IC95%: 45–65), sendo que todos faleceram em tempo mediano de 72 meses (24– 96/IC95%: 65–84). Vinte e um pacientes (68%) encontram-se sem evidência clínica e radiológica de recidiva local e/ou a distância. O seguimento mediano é de 88 meses (24–180/IC95%: 74–102). A taxa de sobrevida global atuarial para sete anos foi de 80% (Figura 1).16,2 Gy em 6 frações de 2,7 Gy; 21 Gy em 7 frações de 3 Gy; 24 Gy em 8 frações de 3 Gy; 35 Gy em 10 frações de 3,5 Gy.